#EmbInterview Leia, na edição de agosto da revista Portugal Inovador, a entrevista da Embaixadora da Ucrânia, Inna Ohnivets, dedicada ao 28 aniversário da Independência da Ucrânia
No curso da sua história milenar, um dos valores fundamentais dos ucranianos foi sempre o desejo de liberdade. Foi isso que os levou a lutar pela independência.
No início do século XX, durante a Revolução Ucraniana de 1917-1921, os ucranianos conseguiram revivificar o estatuto de Estado e, no dia 24 de agosto de 1991, com o Ato da Declaração de Independência da Ucrânia, este foi restaurado.
A proclamação da independência da Ucrânia, em 1991, desempenhou um papel decisivo no colapso da URSS e na eliminação definitiva do império totalitário comunista.
1. Numa altura em que nos aproximamos dos 28 anos da Independência da Ucrânia, de que forma é que esta data será assinalada pela Embaixada?
Para os ucranianos, o Dia da Independência é um dia com um significado particular, uma vez que, durante séculos, o nosso povo lutou pelo direito de viver num estado livre e soberano.
Assim, a comemoração do dia da independência, a 24 de agosto, tornou-se uma festividade de enorme importância, especialmente após a Revolução da Dignidade e nas condições da guerra com a Rússia no Donbas pela integridade territorial.
Seguindo a tradição diplomática, a nossa missão planeia realizar uma receção diplomática para assinalar o 28º aniversário da Independência da Ucrânia e organizará também uma série de eventos culturais e informativos.
Para além disso, um dia antes do Dia da Independência, ou seja, no dia 23 de agosto, nós celebraremos também o Dia da Bandeira Estatal da Ucrânia.
2. Que análise faz de como é que a Ucrânia se encontra nesta fase da sua existência?
Com a independência, para a Ucrânia abriram-se grandes oportunidades. Porém, há 28 anos atrás, ninguém pensaria que a Ucrânia teria hoje de lutar de novo pela sua independência e integridade territorial. A guerra de há já cinco anos com a Rússia resultou na morte de mais de 13 mil pessoas, na ocupação de 7% do território ucraniano e na confiscação, destruição ou roubo de cerca de um quarto do potencial industrial ucraniano.
Enfrentando previsões do colapso do país, a Ucrânia sobreviveu, ergueu-se e avançou firmemente.
Importa referir que, desde 2014, o país tem passado por um caminho de transformação impressionante em vários campos, implementado reformas em conformidade com os padrões europeus no setor da energia, da saúde, das pensões, da educação, da administração pública e da defesa, bem como no caminho da descentralização e da implementação de medidas para a estabilização bancária e macroeconómica, continuando a luta contra a corrupção.
O ano de 2018 foi marcado pelo mais alto ritmo de crescimento económico dos últimos 7 anos: a economia tem vindo a crescer há 12 trimestres consecutivos. As reservas internacionais do Banco Nacional da Ucrânia aumentaram para 20,8 mil milhões de dólares americanos (o maior indicador dos últimos 5 anos). A taxa de inflação diminuiu para 9,8%. Ao mesmo tempo, a dívida do Estado reduziu de 79% para 60,9% do PIB.
3. Como é que nos apresenta o estado atual das relações entre a Ucrânia e Portugal?
Gostaria de assinalar que Portugal foi um dos primeiros países a reconhecer a nossa independência, mais especificamente a 7 de janeiro de 1992, e posteriormente, a 27 de janeiro, Portugal e a Ucrânia estabeleceram relações diplomáticas.
Ao longo destes 28 anos, as relações entre a Ucrânia e Portugal têm-se vindo a fortalecer, continuando a ser fraternas. É bom notar que a parceria luso-ucraniana é baseada na solidariedade e amizade. Agradecemos o apoio consistente de Portugal à soberania e integridade territorial da Ucrânia e a sua posição clara no quadro da União Europeia, da NATO, das Nações Unidas e de outras organizações internacionais.
Hoje em dia, a nossa cooperação baseia-se em mais de 50 acordos bilaterais, existe um interesse mútuo em fortalecer o relacionamento político, aprofundar os fluxos de comércio e de investimentos e criar novas parcerias nos campos científico, tecnológico, cultural e educacional.
Nos últimos anos, tem-se atingido uma nova fase no diálogo político entre os nossos países. Como exemplo, a primeira visita oficial do Grupo Parlamentar de Amizade da Verkhovna Rada da Ucrânia a Portugal, que teve lugar em março deste ano, teve um contributo significativo para a continuação do desenvolvimento da cooperação interparlamentar entre os nossos países.
Importa referir que a vigência do Acordo de Associação entre a Ucrânia e a União Europeia e a entrada em vigor do Acordo bilateral de Cooperação Económica fornecem a necessária base jurídica ao fomento dos negócios e fluxos de investimento entre a Ucrânia e Portugal. Segundo o Serviço de Estatísticas Estatal da Ucrânia, em 2018, o comércio entre a Ucrânia e Portugal aumentou 2,5% em relação a 2017 e ascendeu a 331,3 milhões de dólares americanos.
Neste ano, foi também dado um passo significativo para acelerar a cooperação luso-ucraniana na esfera do turismo. No passado dia 12 de março, em Lisboa, teve lugar o primeiro Fórum para o Desenvolvimento do Turismo Ucrânia-Portugal, organizado pela nossa missão diplomática, a Câmara do Comércio e Indústria da Ucrânia e a Câmara do Comércio Luso-Ucraniana.
A dimensão cultural é uma componente significativa da nossa cooperação bilateral. Com o apoio da Agência Estatal de Cinema da Ucrânia e com o patrocínio institucional do Instituto do Cinema e do Audiovisual de Portugal, em março deste ano, foi realizado, pela primeira vez em Lisboa, o ciclo de cinema ucraniano, que permitiu dar a conhecer ao público português cinco obras cinematográficas da Sétima Arte da Ucrânia.
Sem dúvida, este ciclo também abriu portas a um diálogo artístico entre a Ucrânia e Portugal, e esperamos que o mesmo estimule a criação de novos projetos conjuntos.
Além disso, como é sabido, no passado dia 22 de março, no âmbito da primeira jornada para a qualificação europeia da UEFA, as seleções de Futebol de Portugal e da Ucrânia encontraram-se no Estádio da Luz para um grande espectáculo de futebol, trazendo muitas emoções para os adeptos.
Pessoalmente, estive presente no jogo, assim como o corpo diplomático da nossa Embaixada. Estou contente porque, independentemente do resultado, os adeptos ucranianos e portugueses festejaram o jogo em confraternidade. Sem dúvida, isto foi um acontecimento marcante para as relações dos dois países.
Os dois países continuam vinculados por estreitos laços humanos. Sem dúvida, o significativo número de cidadãos de origem ucraniana residentes em Portugal, já bem integrados na sociedade portuguesa, contribui para o fortalecimento das relações luso-ucranianas.
4. Quais os principais benefícios que os dois países podem retirar da mútua cooperação entre ambos?
Tal como já mencionei anteriormente, neste ano foi dado um passo considerável para o desenvolvimento da cooperação entre a Ucrânia e Portugal na esfera do turismo, do qual, sem dúvida, os dois países podem beneficiar.
De acordo com Ministério da Economia e Desenvolvimento da Ucrânia, em 2018, 21,7 mil portugueses visitaram a Ucrânia, o que representa um aumento de 10,7% em comparação com os anos anteriores. Devido aos voos diretos, aumentou 9,4 vezes o número de ucranianos que visitaram Portugal. Portanto, vamos continuar a aprofundar o diálogo entre a Ucrânia e Portugal no setor do turismo, bem como a intensificar a cooperação entre os operadores turísticos.
Estamos convencidos de que existem oportunidades significativas para fortalecer os esforços mutuamente benéficos, expandindo a nossa cooperação para a área da alta tecnologia.
Hoje, as tecnologias digitais são a base do bem-estar da Ucrânia. O setor de tecnologias de informação e comunicação representa, atualmente, 4% do PIB e dá mais de 150 mil empregos. De acordo com as estimativas, em 2018, a exportação ucraniana dos serviços de telecomunicação e de TIC excedeu 2 mil milhões de dólares.
Importa salientar que o Governo Ucraniano, implementou uma série de medidas para ajudar a desenvolver o referido setor, em particular, através do Fundo de apoio de startups e de vários programas de apoio para os cientistas jovens, e está aberto para uma interação mais ampla, de modo a atingir os resultados pretendidos.
Na nossa opinião, é também crucial concentrar os nossos esforços no setor energético, em particular, nas energias renováveis.
Em 2018, a Ucrânia importou menos 24,8% de gás natural em comparação com 2017. Ao mesmo tempo, o crescimento da produção de eletricidade a partir de fontes renováveis foi de 38,8%.
Segundo o Plano Nacional de Ação para as Energias Renováveis até 2020, e nos termos da Directiva 2009/28/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de Abril de 2009 relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis, a Ucrânia comprometeu-se a atingir 11% de energia produzida a partir de fontes de energia renováveis no consumo final bruto de energia até 2020.
A implementação das medidas previstas na Diretiva 2009/28/CE ajudará a Ucrânia a reduzir significativamente o consumo de recursos energéticos tradicionais em todos os setores da economia nacional, aumentando assim o nível de segurança energética do Estado.
Neste sentido, a experiência de Portugal é de grande importância para a Ucrânia.
5. Num âmbito mais alargado, como é que se encontra a vossa relação com a União Europeia?
O ano de 2019 tornou-se decisivo para a integração europeia da Ucrânia. A Ucrânia deu um importante passo em direção à consolidação constitucional dos objetivos estratégicos de participação na União Europeia e na Aliança do Atlântico Norte. O Parlamento reagiu ao pedido da sociedade, ou seja, tornar-se parte de uma grande família de nações europeias. A fixação da integração europeia na Constituição é uma diretriz importante que permitirá ao país proteger-se da manipulação política.
A Ucrânia mantém-se firme e coerente na sua política destinada a aprofundar as relações com a União Europeia. Após a entrada em vigor do Acordo de Associação, a 1 de setembro de 2017, a sua implementação tornou-se uma das principais prioridades do nosso país.
O Acordo de Associação, dado o seu volume e cobertura temática, é o maior documento legal internacional na história da Ucrânia. O Acordo define um formato qualitativamente novo de relações entre a Ucrânia e a UE no que respeita os princípios de “associação política e integração económica” e serve como um ponto de referência estratégica para reformas socioeconómicas sistemáticas na Ucrânia.
O Acordo prevê uma Zona de Comércio Livre Abrangente e Aprofundada entre a Ucrânia e a UE com base legal para a livre circulação de bens, serviços, capital, parte da força de trabalho entre a Ucrânia e a UE, e uma aproximação regulamentar destinada à entrada gradual da economia da Ucrânia no mercado comum da UE.
Atualmente, os resultados da implementação do Acordo de Associação são tangíveis e os seus benefícios são perceptíveis: 42% do total das exportações ucranianas vão para a UE, o que somou, em 2018, quase 20,2 mil milhões de dólares (mais de 2 mil milhões a mais do que no ano anterior), e cerca de 15 mil empresas ucranianas exportam os seus produtos para países da UE.
A 11 de junho passado, assinalou-se o segundo aniversário da introdução do regime de isenção de vistos entre a Ucrânia e a União Europeia! Eis alguns dados que mostram a importância desta liberdade para os ucranianos. Em dois anos, os cidadãos da Ucrânia realizaram cerca de 42,6 milhões de viagens para a União Europeia. 2,91 milhões de ucranianos fizeram isto com passaportes biométricos sem visto. Durante o segundo ano da vigência deste regime, foram efetuadas 2,35 milhões de viagens isentas de visto pelos ucranianos, o que representa um aumento de 4,2 vezes face ao número de tais viagens no ano anterior, altura em que se registaram apenas 560 mil viagens.
Hoje, o caminho da Ucrânia é apenas um, ou seja, um caminho para a Europa, longe das ambições imperiais da Rússia. E a Ucrânia, restaurando a justiça histórica, está finalmente confiante e orgulhosa deste caminho. Afinal, a Europa não é apenas uma característica geográfica, mas um padrão de vida, o respeito pela humanidade, pelos seus direitos e liberdades. O Acordo de Associação, a isenção de vistos de viagem, a consolidação, na Constituição, do movimento para a UE e para a NATO, todas estas importantes conquistas dos últimos anos demonstram claramente que: o futuro da Ucrânia está na família das nações europeias!
Ao terminar, queria assinalar que 28 anos de independência mostraram ao mundo que a Ucrânia tem sido um Estado soberano, capaz de consolidar valores democráticos e de proteger a liberdade.